EFETIVIDADE NO CONTROLE DA DENGUE QUANTIDADE X QUALIDADE

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O mosquito Aedes aegypti é o principal transmissor de dengue, zika e chikungunya em regiões urbanas do Brasil FOTO: JUAN CARLOS ULATE/REUTERS

O debate em torno do controle da Dengue no Brasil é constante e por vezes se torna repetitivo, pois concentra-se sempre na doença, ou seja, na epidemiologia e número de casos tornando-se polêmico sempre em situações de epidemias, momento em que não há mais ações de prevenção a ser realizadas, restando apenas os prejuízos financeiros, sociais e a vida das pessoas para serem contabilizadas.

Enquanto a comunidade científica busca uma vacina para prevenção desta doença, a única forma real de prevenção é o controle do vetor, que sendo uma espécie de mosquito, o manejo de sua população em níveis que não ofereçam risco á saúde humana depende de ações de Entomologia (especialidade da biologia que estuda os insetos). Ações estas que precisam ser desenvolvidas em campo, através de inspeções contínuas nos imóveis, com coleta de amostras de larvas e também do mosquito adulto, assim como, o Manejo Integrado do Vetor, ou seja, eliminação de criadouros e tratamento químico quando necessário.

Apesar deste entendimento o que temos são serviços exclusivamente públicos submetidos e orientados por uma Política Nacional teoricamente muito bem estruturada, porém de difícil execução por parte dos Municípios que têm a responsabilidade de realizar o trabalho de campo. Todo o serviço de controle preconizado está baseado no número de agentes por número de imóveis do Município, qual seja um (1) agente para cada 800 imóveis. Este parâmetro está teoricamente baseado na capacidade deste agente em inspecionar e tratar um imóvel de tal forma que seu proprietário continue realizando todos os cuidados necessários garantindo a eliminação do risco de proliferação de mosquitos até sua nova visita em dois meses.

Ocorre que no cotidiano grande parte desses imóveis encontram-se fechados tornando esse trabalho inexecutável, cabendo aos gestores formas de resgate deste imóvel, em tempo dentro de um ciclo de visitas para evitar o início de surtos localizados que devem ser mantidos sob controle a fim de evitar epidemias. Além deste contratempo, quando o agente consegue acessar o imóvel este precisa estar devidamente capacitado para reconhecer criadouros, conhecer os hábitos de vida do mosquito, conhecer sinais e sintomas das doenças, ter material de campo para coleta de larvas e insumos para tratamento, ter uniforme e identificação, ter Equipamentos de Proteção Individual para sua segurança e todas as condições de trabalho garantidas. Ainda, esse número de agentes são os mesmos que realizam as ações de bloqueio com inseticida em casos notificados, o que dificulta ainda mais a visita casa a casa uma vez que a ação de bloqueio é prioritária.

Todo o conceito dos serviços é sempre preventivo, no entanto a realidade de muitos Municípios são ações de contingência de casos. E, apesar do Município ter liberdade para trabalhar a rotina de campo da forma que melhor atender sua realidade, a falta de conhecimento por parte dos gestores sobre biologia do vetor impede a operacionalização das ações de campo de forma a otimizar seu quantitativo de agentes, bem como de empregar novas tecnologias de controle que estão disponíveis para uso, as quais reduzem a carga de trabalho diária. Na grande maioria dos serviços não se encontram responsáveis técnicos pelas equipes de agentes, apenas cargos administrativos, isso gera uma série de entraves quando se trata de realizar os serviços, que diante de situações críticas a falta de conhecimento técnico impede a tomada de decisão em tempo oportuno.  

Manter o número de agentes preconizados na Política Nacional é praticamente impossível, em virtude da forma de contratação que se dá por concurso público, onde ocorre uma defasagem e rotatividade constante. No entanto, capacitar as equipes para otimização do trabalho de campo com habilidade e manejo para as atividades é uma responsabilidade do gestor. Inclusive de acordo com legislação nenhum agente deve ser submetido ao trabalho de campo sem ter o mínimo de capacitação preconizado.

Como podemos perceber a eficácia de um serviço não se dá apenas pelo número de agentes mas antes de tudo pela capacitação e segurança no trabalho realizado naquele momento. Um agente capacitado e sob supervisão consegue não apenas eliminar criadouros e tratar mas transmitir conhecimento, ter argumento para conscientizar a população garantindo o envolvimento da comunidade não como uma obrigação, mas por entender que o cuidado deve ser contínuo.

A ingerência dos serviços de controle do vetor pode se dar porque apesar do conceito de prevenção da Política Nacional, seu sistema de avaliação é focado no cumprimento das metas dos Municípios, que se dá através de sistemas de informação em forma de números, ou seja, se cumpriu com o número garante os recursos financeiros mesmo que o município esteja em situação de risco ou em epidemia.

A ineficácia no controle do Aedes aegypti tem causado grandes prejuízos na saúde pública, uma vez que este vetor transmite além da dengue, outras doenças que ainda causam sequelas na população. Neste sentido a falta de gestão dos serviços responsáveis pelo seu controle deve ser avaliada pelas autoridades competentes não apenas em números, mas em eficácia, focando nas ações de prevenção e não somente após grandes epidemias onde as consequências já foram estabelecidas.

Por Marileia Sandra Renostro – Bióloga

Revisado por Prof. Fábio Medeiros da Costa – Biólogo – Entomólogo

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